PROFESSOR PAULO CESAR |
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A Química DOS SENTIDOS: PALADAR E OLFATO
Neuroquímica dos sentidosOS CINCO SENTIDOS
Você, todo dia, entra em contato com o mundo externo, ou seja, tudo aquilo que está além dos limites do seu eu. Esse contato é feito através dos sentidos, que nos seres humanos são definidos classicamente, desde Aristóteles, como cinco: olfato, paladar, visão, tato e audição. É através das sensações captadas por eles que nos relacionamos com o ambiente ao nosso redor, permitindo que nos adaptemos e sobrevivamos. No Museu da Idade Média, também conhecido como Museu de Cluny, em Paris (França), há uma série de seis tapeçarias, datadas do século XV, denominadas A Dama e o Unicórnio. Cinco delas são dedicadas aos cinco sentidos, uma para cada um. Observe cada uma delas:
Atualmente, essa definição clássica de cinco sentidos é contestada. Nos humanos, por exemplo, existem outros sentidos, como a nocicepção (percepção da dor) e a propiocepção, que é a percepção de seu próprio corpo e da localização espaço-temporal de cada uma de suas partes. Outros animais possuem sentidos inexistentes em humanos, como a magnetocepção (percepção do campo magnético terrestre), de aves e insetos, e a eletrodetecção (percepção de campos elétricos), encontrada em peixes e em mamíferos da ordem Monotrêmata, como o ornitorrinco.
ESTRUTURA DO NEURÔNIO
Você já viu que existem seis tapeçarias da série “A Dama e o Unicórnio”. Enquanto cinco delas tratam dos cinco sentidos clássicos, a sexta tapeçaria foge a essa proposta. Ela é denominada Meu único desejo, é a frase que está escrita na tapeçaria. Seu significado tem despertado inúmeros debates, e uma das propostas para explicar seu significado é de que ela trata da capacidade humana de ir além dos sentidos, ou seja, da capacidade de integrar essas sensações primárias e criar aquilo que denominamos conhecimento. Assim, conhecer é apreender a realidade externa a nós e criar modelos do mundo real em nossas mentes. ![]() http://www.musee-moyenage.fr/homes/home_id20393_u1l2.htm Esta integração das sensações é realizada no encéfalo, que é parte do sistema nervoso central. Clique na figura a seguir para aprender mais sobre a estrutura do sistema nervoso dos mamíferos. ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO O tipo de célula presente em todo o sistema nervoso é o neurônio. Conheça mais sobre a estrutura desta célula clicando na figura a seguir: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO Como você pode observar, o neurônio transmite a informação através de uma corrente elétrica que se propaga ao longo de sua membrana plasmática. Relembrar a estrutura da membrana plasmática: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO Em células eletricamente excitáveis, como os neurônios, a membrana plasmática é capaz de conduzir um impulso elétrico pela geração de uma diferença de potencial entre o meio interno e o meio externo (intra e extracelular). Essa diferença de potencial é gerada pela acumulação de íons de cargas opostas em cada uma das faces da membrana, o que é possível devido à permeabilidade seletiva da membrana para os diferentes íons. ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO TRANSMISSÃO DO IMPULSO NERVOSO
Como você já viu, a transmissão do impulso nervoso ao longo da membrana plasmática depende de etapas subseqüentes de despolarização e repolarização. Observe esse processo com mais detalhes: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO Esse processo se propaga ao longo da membrana plasmática até chegar à sinapse. Veja como é a sua estrutura: ![]() Nesse ponto, não há contato físico direto entre o neurônio pré-sináptico e a célula pós-sináptica (outro neurônio ou uma célula efetora). Como essas duas células irão se comunicar? Nos organismos vivos, a conversação entre duas células é de natureza química, e o vocabulário empregado são os mediadores químicos. Observe os tipos de diálogos que as células podem ter: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO Repare que o diálogo entre o neurônio pré-sináptico e a célula pós-sináptica é feita pela liberação de um neurotransmissor, que se difunde na fenda sináptica até se ligar ao seu receptor pós-sináptico, que é uma proteína capaz de reconhecer seletivamente a estrutura desse neurotransmissor. De que forma a mensagem carreada por este neurotransmissor atinge o interior da célula pós-sináptica, se essa ligação com o receptor se dá na face externa da sua membrana celular? Essa mensagem pode ser passada para o interior da célula através de dois processos diferentes. O primeiro deles envolve a formação de segundos mensageiros intracelulares, promovida pela ligação do neurotransmissor ao seu receptor. Veja como isso ocorre: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO O segundo tipo de processo que pode ocorrer para levar a informação do neurônio pré-sináptico para a célula pós-sináptica é através da mudança da concentração de certos íons nesta última. Isso é mediado pela abertura ou fechamento de canais iônicos acoplados aos receptores: ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO É dessa forma que as sensações percebidas nos órgãos dos sentidos são conduzidas até o nosso cérebro: elas geram um impulso nervoso, que será conduzido por neurônios até o SNC, onde a informação será processada e, caso necessário, uma resposta será enviada aos diversos órgãos do organismo, agora seguindo o caminho inverso: um impulso será disparado do SNC e será conduzido por neurônios até as células efetoras. Por exemplo, quando sentimos o odor e o sabor dos alimentos, esta informação, depois de processada pelo cérebro, disparará a secreção salivar e a secreção de suco gástrico, entre outros efeitos. Os neurotransmissores podem ser excitatórios, ou seja, podem excitar a célula pós-sináptica, ou podem ser inibitórios. É o balanço entre esses neurotransmissores que regula o funcionamento normal do organismo; o desequilíbrio na produção de algum deles pode gerar doenças muito severas, como o Mal de Parkinson. NEUROTRANSMISSORESUm grande número de neurotransmissores localizados no SNC pertence à classe das aminas biogênicas, como a norepinefrina (noradrenalina), a dopamina, a histamina e a serotonina. A biossíntese desses compostos se dá principalmente pela descarboxilação de aminoácidos, podendo ocorrer também oxidação de anéis aromáticos, com conseqüente introdução de hidroxilas fenólicas. Todos os receptores de aminas biogênicas são acoplados a proteínas G. ![]() A serotonina, também conhecida como 5-hidroxitriptamina (5-HT), é biossintetizada a partir do aminoácido L-triptofano. Até o momento, foram identificadas sete subfamílias de receptores serotoninérgicos; essas subfamílias podem ser divididas em diferentes populações de receptores. Por exemplo, a subfamília 5HT1 é constituída por 10 subtipos de receptores. Os receptores 5HT1A estão localizados em alta densidade no hipocampo, amígdala, septo e sistema límbico. Esses receptores estão envolvidos no controle da ansiedade, depressão, agressividade, impulsividade e alcoolismo. Outros receptores serotoninérgicos parecem estar envolvidos com o controle da depressão e de quadros de psicose, como os subtipos 2A, 3, 5, 6 e 7, enquanto o subtipo 4 parece estar envolvido com os processos de aprendizagem e memória e presente em baixo número em pacientes portadores do Mal de Alzheimer. Desde o final da década de 1920 havia indícios de que a adenosina e seus nucleotídeos (AMP, ADP e ATP) atuavam como neurotransmissores no SNC e em órgãos periféricos, modulando ações como o controle da pressão arterial e contração intestinal. Somente na década de 1970 foram identificados dois tipos de receptores purinérgicos, os receptores P1 (maior afinidade para adenosina) e P2 (maior afinidade para ATP). Atualmente são conhecidos quatro receptores de adenosina (A1, A2A, A2B e A3), acoplados a proteínas G, sete receptores para nucleotídeos (AMP, ADP, ATP e UTP) do tipo P2X (P2X1 a P2X7), acoplados a canais iônicos, e pelo menos sete receptores do tipo P2Y, acoplados a proteínas G. Os receptores purinérgicos têm demonstrado um papel fundamental no controle de diversas funções do SNC, atuando nos processos epilépticos e neurodegenerativos, na indução do sono, na doença de Parkinson e nos quadros de psicose; nestes dois últimos, seus efeitos demonstram ser indiretos, através da modulação de receptores dopaminérgicos. A acetilcolina (Ach) é um neurotransmissor envolvido nos processos cognitivos e de manutenção da atenção no SNC. Seus efeitos são mediados por dois tipos de receptores: um acoplado à proteína G, de alta afinidade pela muscarina (receptor muscarínico), e outro ionotrópico e de alta afinidade pela nicotina (receptor nicotínico). ![]() Átomos e ligações que se correspondem em cada estrutura encontram-se marcados com cores específicas: em azul, átomo de nitrogênio quaternário; em vermelho, sítio doador de elétrons para ligação hidrogênio; em verde, cadeia espaçadora entre eles. Três aminoácidos desempenham um papel fundamental nos processos de transmissão sináptica rápida: o glutamato (excitatório), o ácido gama-aminobutírico (ou GABA) e a glicina (inibitória). ![]() O ácido glutâmico (glutamato) é um neurotransmissor excitatório amplamente distribuído, presente em mais de 50% do tecido nervoso. Possui papel fundamental no desenvolvimento do tecido nervoso e é responsável por sua plasticidade no sistema nervoso amadurecido. Está diretamente relacionado aos processos de aprendizado e memória, bem como no desenvolvimento de diversas patologias neurodegenerativas. Já o GABA e a glicina são neurtotransmissores inibitórios, e estão envolvidos com a ansiedade e a epilepsia. Um grande número de neuropeptídeos também atua como neurotransmissores no SNC, como os opiáceos endógenos, os hormônios hipotalâmicos, as taquicininas e as melanocortinas. Vários destes neuropeptídeos demonstram estar associados a certas patologias do SNC e ligantes específicos de seus receptores vêm sendo desenvolvidos como candidatos a novos fármacos. Por exemplo, antagonistas do receptor NK1 da substância P apresentam atividade antidepressiva e ansiolítica. Receptores de colecistoquinina e de melanocortinas também têm sido estudados devido a seus papéis no controle da depressão endógena. Este é um campo rico e ainda relativamente pouco explorado no tratamento de distúrbios e patologias do SNC.
O OLFATOComo você já viu, o olfato é provavelmente o sentido mais primitivo dos animais. A sensação do odor surge quando moléculas voláteis, que são carreadas pelo ar até o interior do nariz, dissolvem-se no muco presente na cavidade nasal e então interagem com receptores localizados nas terminações nervosas do epitélio olfativo, que difere do epitélio respiratório; este não é inervado nem participa da aquisição das sensações olfativas. Clique na figura abaixo para ver um vídeo sobre o olfato. ![]() CLIQUE PARA VER A ANIMAÇÃO Os receptores do epitélio olfativo possuem alta especificidade de interação com as moléculas (ligantes) que causam a sensação de odor; essa interação promove a produção de AMP cíclico no neurônio, mas, neste caso, esse segundo mensageiro não irá fosforilar proteínas citoplasmáticas, mas promoverá a abertura de um canal iônico, o que levará à despolarização desse neurônio. Esse impulso elétrico será conduzido pelo axônio neuronal até o encéfalo, chegando a áreas como a amígdala (envolvida com a resposta emocional ao odor) e o hipocampo (envolvido com a memória). Os seres humanos, ao longo da evolução, tiveram diminuição da sua capacidade olfativa, em comparação com outros animais. Os cães, por exemplo, possuem uma área de epitélio olfativo aproximadamente 10 vezes maior, além de possuir um maior número de receptores por área. Mesmo outros primatas possuem o sentido do olfato mais desenvolvido que os humanos; parece que mutações em genes específicos são a causa dessa diferença. Os estudos sobre a evolução dos primatas indicam que o olfato perdeu, para a visão, o lugar de principal sentido para permitir realizar as tarefas que garantiriam a manutenção da espécie, ou seja, obter alimento e acasalar. ![]() Os cães são animais macrosmáticos, enquanto os primatas, como os gorilas, são microsmáticos. Os cetáceos, como a baleia, são anosmáticos, por não possuírem aparelho olfativo. Como ocorre com tantos outros temas, o sentido do olfato também se tornou alvo de experimentos pseudocientíficos. Algumas pessoas afirmam possuir “habilidade” paranormal de sentir odores de lugares distantes (olfato remoto), não só no espaço, mas também no tempo! Entretanto, quando submetidos a ensaios controlados, não conseguem provar esta “capacidade”. Este é um bom tema para você discutir com seus alunos: a diferença entre ciência e pseudociência.
O PALADARO paladar é o sentido que detecta o sabor daquilo que comemos, ou, de forma mais geral, daquilo que entra em contato com as papilas gustativas presentes na língua. Essas papilas são formadas por células sensoriais que interagem com moléculas presentes no alimento e dissolvidas na saliva ou nos líquidos presentes na boca, gerando um impulso que será conduzido até o encéfalo. Existem quatro tipos comprovados de papilas gustativas, responsáveis pelas sensações de doce, salgado, amargo e azedo (ácido), mas há discussões sobre a existência de outros tipos, que seriam responsáveis pela sensação de sabor de carne (umami) e pelo sabor associado a ácidos graxos como o ácido linoleico (presente no óleo de girassol, na forma de triglicerídeo). O umami, por sua vez, seria provocado por ácido glutâmico, um aminoácido dicarboxílico que também atua como neurotransmissor no SNC, além de ser empregado como tempero para carnes (glutamato sódico). Os vários tipos de papilas gustativas estão distribuídos por toda a língua, sendo pequena a diferença de concentração desses diferentes tipos em cada região da língua. ![]() Língua humana e papilas gustativas de língua de macaco (micrografia eletrônica de varredura) Vários fatores afetam a sensação do paladar, como a idade, variações hormonais, variações genéticas e sensoriais (olfato e visão). Um exemplo de variação genética é a capacidade de sentir o sabor amargo da feniltiouréia: cerca de 70% da população mundial é capaz de sentir seu sabor, enquanto para os outros 30% ela é praticamente insípida. Essa taxa, entretanto, varia em função da etnia da população; os ameríndios são os mais sensíveis (98%). As mulheres também são, de modo geral, mais sensíveis que os homens ao sabor desse composto. ![]() Entretanto, uma simples modificação na sua estrutura – a troca do átomo de enxofre por oxigênio – gera a dulcina, um composto de sabor doce. Isso parece estar envolvido com o tipo de interação entre esses compostos e os receptores para sabores doce e amargo: ![]() Modelo da interação entre o receptor (azul) e o ligante (vermelho). O sítio X-H do receptor atua como doador de hidrogênio para ligação de hidrogênio, enquanto o sítio Y atua como doador de elétrons. Quando as interações de X-H e Y com seus sítios complementares no ligante possuem forças semelhantes, o composto é sentido como doce; se uma delas é mais fraca que a outra, o sabor é percebido como amargo. ![]() Na dulcina, o oxigênio da carbonila atua como doador de elétrons, complementar ao sítio X-H do receptor, enquanto o NH2 atua como doador de hidrogênio complementar a Y no receptor. A distância correta entre esses grupos e a igual força de interação deles com o receptor faz com que a dulcina ative a sensação de doce. ![]() Na feniltiouréia, o sítio complementar a X-H é uma tiocarbonila (C=S). Como a interação entre X-H e S é mais fraca que aquela entre N-H e Y, o sabor é percebido como amargo. A necessidade de dissolução do composto em água para que seu sabor possa ser sentido permite que possamos alterar a solubilidade de uma substância para modificar seu sabor. Por exemplo, o cloranfenicol, um antibiótico muito utilizado, é extremamente amargo, sendo, assim, difícil o seu uso por via oral. Sua conversão em um éster de ácido palmítico (palmitato de cloranfenicol) faz com que ele se torne insolúvel em água, e assim seu sabor amargo praticamente não é percebido, o que permite seu uso em formulações orais. ![]() O paladar, como vimos, é bastante associado ao olfato. Além dos receptores do paladar e do olfato, o sabor de um alimento também dependerá da estimulação de receptores de frio, calor e dor, que são atribuições sensitivas do nervo trigêmeo. Assim, é o conjunto da estimulação de receptores olfativos, papilas gustativas e receptores do ramo mandibular do nervo trigêmeo que irá criar no cérebro a sensação do sabor de um alimento. O uso contínuo de estimuladores dos nociceptores do trigêmeo levará à sua dessensibilização, como ocorre quando usamos continuamente pimenta na alimentação: depois de algum tempo, não sentimos mais seu sabor. Em certas culturas, como a iorubá (da África Ocidental), é comum dar pimenta às crianças desde a fase de colo, o que permite que consumam grandes quantidades de pimenta quando adultos, muito acima do que outras pessoas podem suportar. ![]() O acarajé é uma comida de origem iorubá, e bem temperado com pimenta! Essa ativação do nervo trigêmeo explica também por que a pimenta faz os olhos arderem: é a estimulação dos nociceptores do ramo oftálmico do trigêmeo. Neste caso, a defesa do organismo é fechar os olhos, numa resposta reflexa a essa estimulação do trigêmeo, para diminuir o acesso da substância irritante ao órgão que está sendo agredido. Isso também explica por que fechamos os olhos ao comermos algo muito temperado com pimenta: a estimulação do ramo mandibular é registrada pelo encéfalo, que responde com ações para as diversas regiões inervadas pelo trigêmeo, como a dos olhos, onde a resposta é fechá-los. O mentol e a cânfora, substâncias presentes em diversas plantas, são capazes de ativar os receptores de frio do trigêmeo, o que justifica o seu emprego em balas, outros alimentos e em pastas de dentes, visando a causar a conhecida sensação de ”refrescância”. ![]()
Propriedades fisico-químicas e os sentidosOs sentidos do paladar e do olfato, como você viu, são sentidos químicos, ou seja, dependem da interação de moléculas com receptores neuronais específicos. Dessa forma, as sensações obtidas por esses sentidos são fortemente dependentes das estruturas e das propriedades físico-químicas das moléculas que irão ativá-los. Em relação ao olfato, a principal propriedade físico-química a ser estudada é a volatilidade dos componentes do objeto que está sendo cheirado. Essa propriedade está diretamente relacionada às interações entre as moléculas dessas substâncias, de forma a permitir a passagem do estado líquido ou do estado sólido para a fase gasosa (evaporação e sublimação, respectivamente) e ser carreado pelo ar até os bulbos olfativos no interior do nariz. ![]() Evaporação (http://www.flickr.com/photos/oldonliner/436326382/) e Sublimação (http://www.flickr.com/photos/slice/464646935/) No sentido do paladar, a principal propriedade físico-química envolvida é a solubilidade em água, que representa a capacidade das moléculas de uma substância de formar interações com moléculas de água (interações soluto-solvente) às custas das interações entre as moléculas dessa mesma substância (interações soluto-soluto) e entre moléculas do solvente. Assim, para compreender como certas moléculas conseguem ativar esses sentidos e outras não, é preciso compreender essas interações intermoleculares. As mais importantes – e que iremos discutir aqui – podem ser enquadradas em três categorias:
Outras interações menos discutidas são variações das interações do tipo dipolo-dipolo, como a íon-dipolo e os complexos de transferência de carga, também chamados de interações do tipo π-stacking (a tradução literal seria empilhamento de sistemas π), em que um anel aromático, normalmente ligado a um grupo eletrodeficiente (R2), funciona como dipolo positivo, e então forma uma interação dipolo-dipolo com outro anel aromático ligado a um grupo doador de elétrons (R1), porém de alta densidade eletrônica e que atua como dipolo negativo. Esse tipo de interação é muito importante no meio biológico, pois possibilita a interação entre os anéis aromáticos presentes nas estruturas de diversos fármacos e os anéis aromáticos de resíduos de aminoácidos como a tirosina e o triptofano. ![]() INTERAÇÕES INTERMOLECULARESAs ligações de hidrogênio (também chamadas ligações hidrogênio) são interações intermoleculares que ocorrem entre um átomo de hidrogênio com baixa densidade eletrônica em uma molécula e um átomo de alta densidade eletrônica em outra molécula. ![]() As ligações de hidrogênio mais fortes são aquelas em que X e Y são átomos de alta eletronegatividade, como flúor, oxigênio e nitrogênio (o tradicional FON dos livros de Química), mas outros átomos podem participar, como enxofre, cloro e até mesmo carbono, desde que outros átomos ligados a este promovam um acentuado momento de dipolo, gerando uma forte redução da densidade eletrônica do hidrogênio, como ocorre, por exemplo, no clorofórmio. Este trihalometano pode interagir com outras moléculas orgânicas, como a acetona e a piridina, através desse tipo de interação. ![]() Além de ocorrer entre moléculas, também podem existir ligações de hidrogênio intramoleculares, sendo mais comuns quando ocorre a formação de um anel de 5 ou de 6 membros: ![]() Por sua vez, as interações dipolo-dipolo ocorrem entre dipolos de menor intensidade que aqueles envolvidos na ligação de hidrogênio, como ocorre, por exemplo, entre moléculas de acetona. ![]() Por último, as forças ou interações de van der Waals ocorrem entre dipolos muito fracos, como aqueles que existem em cadeias hidrocarbônicas e que são gerados pelo próprio movimento das nuvens eletrônicas. Esses dipolos podem ser permanentes ou induzidos, como quando há a aproximação de um átomo polar a uma cadeia hidrocarbônica. ![]() ![]() As interações de van der Waals, assim como as ligações de hidrogênio, são na verdade casos especiais de interações dipolo-dipolo. Enquanto as primeiras são interações dipolo-dipolo muito fracas, estas últimas são muito fortes, o que lhes confere esses nomes especiais. Entretanto, embora as interações de van der Waals sejam isoladamente fracas, quando temos uma cadeia hidrocarbônica longa ocorre a formação de diversas interações deste tipo, e o somatório da energia associada a cada uma delas pode sobrepujar até mesmo uma interação do tipo ligação de hidrogênio. Observe, no quadro a seguir, a comparação das energias associadas a cada tipo dessas interações intermoleculares e compare a ligação covalente.
Como você pode ver, todas essas interações intermoleculares são mais fracas que as ligações covalentes. O somatório dessas interações intermoleculares define o grau de coesão intermolecular de uma substância, e, assim, define a energia necessária para separar as interações, como ocorre nas mudanças de estado físico e na solubilização em água. Quanto mais forte e maior o número dessas interações, mais difícil será afastar as moléculas e promover a fusão, a evaporação e a solubilização. Veja em seguida esses processos em detalhes.
PONTO DE FUSÃO E PONTO DE EBULIÇÃOObserve a tabela a seguir.
Nesta série de três compostos com pesos moleculares muito próximos, observamos um aumento de ponto de ebulição na seguinte seqüência: hidrocarboneto < cetona < álcool. Isso ocorre devido à força das interações intermoleculares: nos hidrocarbonetos, temos apenas forças de van der Waals atuando, enquanto a coesão entre as moléculas de butanona é determinada por interações dipolo-dipolo, requerendo, assim, mais energia térmica para promover a separação das moléculas e a conseqüente mudança de estado físico. O mesmo raciocínio é empregado para justificar o maior ponto de ebulição do butanol, que, por ser um álcool, tem suas moléculas unidas por ligações hidrogênio, além das interações de van der Waals que ocorrem entre as cadeias hidrocarbônicas. Veja esta outra tabela:
Aqui você pode observar como a capacidade de aproximação entre os grupos capazes de realizar ligações hidrogênio intermoleculares determina o valor de ponto de fusão. No caso dos ácidos o-toluico e salicílico, que possuem substituintes na posição orto ao grupo ácido carboxílico, o ponto de fusão é menor que seus isômeros em que esses grupos encontram-se na posição para. Isso se dá pelo impedimento estérico (volume ocupado) que esses grupos promovem ao redor da carboxila (CO2H), dificultando a aproximação entre carboxilas de duas moléculas desses ácidos, diminuindo assim a coesão intermolecular. Por outro lado, os ácidos que possuem uma função hidroxila adicional (ácidos salicílico e 4-hidroxibenzóico), também capazes de realizarem ligações hidrogênio, possuem ponto de fusão mais elevado que os outros dois. Veja outro exemplo de como os efeitos estéricos podem afetar uma propriedade físico-química. No gráfico a seguir, você encontra a correlação entre os valores de peso molecular e ponto de ebulição de uma série de ésteres de ácidos acéticos (acetatos), descritos na tabela posterior ao gráfico. ![]()
Observe que na seqüência dos ésteres de cadeia linear existe uma correlação positiva entre os valores de ponto de ebulição e o aumento da cadeia hidrocarbônica (linha vermelha), o que pode ser explicado pelo aumento das interações intermoleculares do tipo van der Waals. Entretanto, os ésteres de cadeia ramificada fogem dessa reta, já que a ramificação dificulta a aproximação das cadeias para que ocorra a formação de interações de van der Waals mais efetivas (reflita: se essas interações são muito fracas, pequenos aumentos na distância entre as cadeias causam redução significativa da coesão intermolecular, reduzindo assim o ponto de ebulição). ![]() Situação semelhante pode ser observada em uma série de ésteres metílicos de ácidos graxos: o aumento da cadeia hidrocarbônica leva ao aumento dos valores de ponto de fusão e de ebulição, mas a presença de insaturações leva a uma queda nestes valores . Isso ocorre porque as ligações duplas das cadeias dos ácidos graxos insaturados são regiões de alta densidade eletrônica, e quando duas cadeias se aproximam a repulsão entre essas ligações impede uma interação intermolecular maior. ![]()
É por isso que, atualmente, existe uma preocupação muito grande com o consumo de gorduras hidrogenadas: elas são predominantemente saturadas, com alto grau de associação intermolecular, o que pode levar a doenças, além de diminuir a fluidez da membrana celular. Essa propriedade de fluidez da membrana plasmática, fundamental para a manutenção da vida, é dependente da presença de insaturações nas moléculas dos ácidos graxos que constituem a sua bicamada fosfolipídica. Será que seus alunos imaginam que a Química pode explicar algo tão fundamental para a manutenção das condições de saúde deles?
SOLUBILIDADEAnalise a propriedade da solubilidade em água. Veja a tabela e o gráfico a seguir:
![]() Nesta série de ácidos dicarboxílicos, você pode perceber que a solubilidade em água diminui com o tamanho da cadeia hidrocarbônica. Isso pode ser explicado assim: ![]() Antes de ocorrer a solubilização, as moléculas do soluto estão unidas por ligações de hidrogênio (verde) e interações de van der Waals (azul), enquanto as moléculas de água interagem entre si por ligações hidrogênio (verde). ![]() ![]() No início do processo de solubilização, é necessário que ocorra a quebra de interações soluto-soluto (ligações hidrogênio e van der Waals) e solvente-solvente (ligações hidrogênio) e se inicie o processo de formação de interações soluto-solvente (ligações hidrogênio). ![]() ![]() Ao final desse processo, as interações soluto-soluto estão rompidas, e todas as moléculas do soluto estão interagindo com moléculas de solvente. Conseqüentemente, para que o processo de solubilização ocorra, é necessário que a energia associada à formação das interações soluto-solvente compense a energia gasta na quebra das interações soluto-soluto e solvente-solvente. Quando ocorre o aumento da cadeia hidrocarbônica, isso não ocorre, já que não há formação de interações entre a água e a cadeia (na verdade, ocorre repulsão), e a energia associada às ligações hidrogênio soluto-solvente não compensa essa repulsão nem a quebra das interações soluto-soluto e solvente-solvente. A polaridade da molécula também é importante para a sua solubilização em água. Veja o caso de dois ácidos isoméricos, os ácidos maléico e fumárico: ![]() Devido à sua geometria, o ácido maléico apresenta um momento de dipolo diferente de zero (representado pela seta vermelha), o que faz com que ele possua alta solubilidade em água. Já o ácido fumárico é muito pouco solúvel, porque o momento de dipolo é zero nesta molécula, já que o vetor de momento de dipolo de uma carboxila é cancelado pelo da outra carboxila.
ACIDEZ E BASICIDADEOutra propriedade importante para o sentido do paladar é o caráter ácido-base dos compostos orgânicos. Em Química Orgânica utilizamos principalmente as teorias de Bronsted-Lowry e de Lewis sobre acidez e basicidade; assim, o ácido acético é tipicamente um ácido em meio aquoso, já que tende a doar [H+] para a base (água), formando a base conjugada (acetato), ![]() enquanto a trietilamina se comporta como base nesse mesmo solvente, por doar um par de elétrons, o que corresponde a receber [H+]. ![]() Entretanto, em outros solventes, essas mesmas espécies podem ter comportamentos opostos, como acontece com o ácido acético na presença de ácido sulfúrico concentrado. ![]() Como a estrutura influencia a acidez/basicidade de um composto? Os grupos ligados ao sítio ionizável podem modular essas propriedades através de três efeitos diferentes: a. Efeito indutivo Este é um efeito eletrônico que se transmite ao longo das ligações σ. Através dele, átomos eletronegativos retiram (“puxam”) elétrons do sítio ionizável, enquanto cadeias hidrocarbônicas doam elétrons. No caso dos ácidos, os grupos que retiram elétrons (GRE) diminuem a densidade eletrônica do carboxilato, aumentando sua estabilidade: ![]() Quanto mais estável for a base conjugada, maior a acidez do ácido correspondente. Seguindo o mesmo raciocínio, grupos doadores de elétrons (GDE) irão diminuir a acidez, por aumentar a densidade eletrônica do carboxilato, diminuindo sua estabilidade. ![]() Para as bases, ocorre o efeito inverso: os GDE aumentam a densidade eletrônica do sítio básico, favorecendo sua capacidade de doar um par de elétrons, enquanto os GRE diminuem-na, levando então a uma base mais fraca: ![]() O efeito indutivo se perde muito rapidamente com o aumento do número de ligações σ entre o sítio ionizável e os GDE/GRE. Veja um exemplo:
Veja como o valor de pKa (constante que mede a acidez de um composto) aumenta com o distanciamento do grupo GRE (Cl) do sítio ionizável (CO2H). Isso ocorre em função da redução do efeito indutivo com o aumento dessa distância.
b. Efeito estérico Esse efeito é exercido por átomos ou grupos volumosos. Ele dificulta a aproximação da espécie que reage com o ácido ou base orgânica; assim, o efeito estérico sempre leva a uma redução da acidez ou da basicidade: ![]() c. Efeito de ressonância Esse efeito eletrônico, ao contrário do efeito indutivo, não se dá ao longo das ligações σ, mas envolve as ligações π e elétrons em orbitais n, desde que essas ligações e os elétrons n estejam em orbitais paralelos que possam se conjugar: ![]() Podemos representar este efeito através das formas de ressonância do composto: ![]() Nesse esquema, A e B são formas de ressonância da N,N-dimetil-2-propenamina (N,N-dimetilalilamina). Embora A seja a forma que melhor representa esse composto, por não haver separação de cargas, algumas das propriedades eletrônicas desta amina podem ser explicadas pela forma de ressonância B. Nenhuma das duas formas de ressonância corresponde ao composto real, que é mais bem representado pelo somatório das propriedades eletrônicas de cada forma de ressonância; esse somatório é o híbrido de ressonância, representado no esquema por C. Não esqueça que A e B não existem; logo, não há equilíbrio entre as formas de ressonância (veja que a seta utilizada entre elas é uma seta de duas pontas e não duas setas em sentidos opostos!). Ao desenhar formas de ressonância, estamos desenhando, de certa forma, um mapa da distribuição eletrônica do sistema π de uma molécula; assim, apenas elétrons se movem, e os núcleos atômicos permanecem imóveis nas diversas formas de ressonância. O efeito de ressonância permite o espalhamento de elétrons ao longo de vários átomos na estrutura do composto, levando a uma redução da densidade eletrônica. No caso dos ácidos, isso favorece a acidez, por aumentar a estabilidade da base conjugada; no caso das bases, essa redução da densidade eletrônica tende a diminuir a basicidade do composto. O efeito de ressonância geralmente predomina sobre os demais efeitos estereoeletrônicos. Nas aulas sobre ácidos carboxílicos (vinagre), aminas (pimenta) e fenóis (canela), discutiremos mais profundamente as conseqüências do efeito de ressonância sobre a acidez e a basicidade dos compostos orgânicos. O efeito de ressonância também explica por que os ácidos carboxílicos são mais ácidos que os álcoois. A base conjugada dos ácidos carboxílicos (carboxilato) é estabilizada por ressonância, levando à distribuição do par eletrônico entre dois átomos de oxigênio: ![]() No caso dos alcóxidos (bases conjugadas dos álcoois), como não há ressonância, o par eletrônico advindo da quebra da ligação O-H fica concentrado no átomo de oxigênio, diminuindo assim a estabilidade da base conjugada e, conseqüentemente, reduzindo a acidez dos álcoois em comparação aos ácidos carboxílicos: ![]()
Este site foi atualizado em 18/01/11 |