PROFESSOR

PAULO CESAR

PORTAL DE ESTUDOS EM QUÍMICA
 

DICAS PARA O SUCESSO NO VESTIBULAR: AULA ASSISTIDA É AULA ESTUDADA - MANTER O EQUILÍBRIO EMOCIONAL E O CONDICIONAMENTO FÍSICO - FIXAR O APRENDIZADO TEÓRICO ATRAVÉS DA RESOLUÇÃO DE EXERCÍCIOS.

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A Química na cozinha

apresenta: AS CEBOLAS

Introdução

Caros leitores e leitoras. Convido-lhes para saborear os produtos da reação de Maillard. “Como?” Dirão alguns leitores, surpresos. Escrevendo assim até parece estranho, uma espécie de pegadinha, mas se eu estivesse convidando-lhes para degustar um suculento churrasco em minha casa, rigorosamente falando, estaria me referindo ao mesmo fenômeno químico.

Sim, a Química está em todo o lugar. Inclusive na sua cozinha. A ação de cozinhar muito se assemelha com a de um químico, que em seu laboratório procura obter novos compostos. Vários fenômenos físicos e químicos se dão neste cômodo da casa, e a simples substituição de erlenmeyers e bicos de Bunsen por panelas e fogões, respectivamente, não ofuscam em nada a incrível semelhança entre as duas práticas. Ao aquecer um alimento, você está promovendo uma série de reações químicas. Inclusive, há quem diga que está surgindo uma nova profissão: “o químico/cozinheiro”.

O primeiro artigo da série “Química na Cozinha” irá descrever os motivos pelos quais nós, ao cortarmos cebolas, não conseguimos conter as lágrimas. Será tão ruim assim cortar cebolas que não conseguimos nos conter ou há “alguma química” por trás disso?

 

 

As cebolas e os aspectos histórico e biológico

A cebola (Allium cepa) é uma espécie que se cultiva desde épocas remotas. Foi domesticada independentemente em vários lugares do mundo. Todos os povos antigos (caldeus, gregos e romanos) a consumiam em larga escala. No Egito há documentos que descrevem a importância da cebola como alimento e seu uso em arte, medicina e na mumificação. Foi encontrada freqüentemente em sarcófagos, sendo associada às superstições e mitologias egípcias.

A classificação taxonômica da cebola é:

Divisao: Magnoliophyta
Classe: Liliopsida
Ordem: Liliales
Familia: Liliaceae
Gênero: Allium
Espécie: Allium cepa L.

Ela é uma planta herbácea, com folhas cerosas e raízes fasciculadas (em forma de cabeleira). Possui baixo teor protéico e de aminoácidos essenciais, não podendo ser considerada uma boa fonte nutritiva. O teor de água varia de 86% a 92% conforme a espécie em análise.

 

Por que choramos ao cortar cebolas?

A explicação remete a uma análise da constituição da cebola. Os que freqüentam a cozinha, não só para comer, mas para preparar os alimentos sabem do que estou falando. As cebolas nos fazem chorar. E quem já prestou atenção neste fenômeno, percebeu que choramos apenas quando estamos cortando-as. Uma cebola colocada em uma estante do mercado é inofensiva, isto é, não emite nenhum composto irritante aos nossos olhos. Isso ocorre porque as enzimas que ativam o sabor e biogênese do fator lacrimejante são guardadas em vacúolos no citoplasma. (veja um vídeo das células de uma cebola no microscópio).

Quando cortamos a cebola, rompem-se os vacúolos liberando as enzimas que promovem a formação dos compostos sulfurados.

Também é o corte, diga-se de passagem, que libera substâncias que dão cheiro ao prato. Cortar, amassar ou triturar alho e cebola resulta na destruição de milhões de células que liberam seu conteúdo (veja Figura 1). Nelas estão, entre outras coisas, um sulfóxido do aminoácido cisteína e enzimas chamadas alinases, que provocam a transformação do sulfóxido em ácido propenilsulfênico (veja Figura 2). Aquele perfume maravilhoso do refogado vem a seguir, com a “transformação espontânea” do ácido propenilsulfênico em tiossulfinato, este sim o responsável pelo cheiro característico da cebola.

Figura 1 - Posição subcelular dos intermediários e precursores das substâncias responsáveis pelo cheiro característico nos Alliums (alhos e cebolas). Na cebola, a alinase está no vacúolo de todas as células.
(Desenho fora de escala)

 

 

Figura 2 - Transformação do PRENCSO em ácido 1-propenilsulfênico

Mas quem faz a gente chorar é outro composto. O ácido propenilsulfênico, dizia-se, também se transforma espontaneamente em propanotial-S-óxido – este sim o fator lacrimogêneo volátil que irrita os olhos e dispara o reflexo de produção de lágrimas em abundância (veja Figura 3). São tantas que o duto lacrimal, que despeja para dentro do nariz as lágrimas constantes que limpam e lubrificam os olhos, não dá mais conta. Todos dos dias, os olhos produzem 30 miligramas (quase uma colher de sopa) de lágrimas, um lubrificante natural.

Figura 3 – Transformação do ácido 1-propenilsulfênico em propanotial-S-óxido e tiossulfinato

Mas todo esse melodrama só acontece com a cebola. No alho, um “primo-irmão” da cebola, mesmo amassando-o e triturando-o não sentimos nenhuma irritação nos olhos. Mas o alho também produz o tiossulfinato, não o propanotial-S-óxido. A questão é: Por quê?

Um grupo de japoneses publicou, na revista Nature, uma explicação para essa incógnita. Segundo os pesquisadores, o ácido propenilsulfênico não se transforma espontaneamente no fator lacrimogêneo. Quem faz isso é uma outra enzima, até então desconhecida, que apenas as cebolas possuem e que os pesquisadores tiveram a original e conveniente idéia de nomear como “sintase do fator lacrimogêneo”.

O ácido propenilsulfênico é formado quando se destroem as células de alhos e cebolas e após se transforma espontaneamente no tiossulfinato, este sim que dá o perfume ao alimento. Mas os olhos só ardem com as cebolas porque só elas possuem a tal da segunda enzima que converte o mesmo ácido em fator lacrimogêneo.


 

Figura 4 – Produção de ácido sulfúrico e outros produtos que irritam o globo ocular

Após a síntese do fator lacrimejante (propanotial-S-óxido) este, altamente volátil, chega até o fluido que lubrifica o nosso globo ocular formando substâncias que desencadeiam a produção exagerada de lágrimas, fazendo a gente chorar (veja Figura 4).

Para acabar com a choradeira na cozinha, os pesquisadores sugerem nada menos que a produção de uma cebola transgênica, sem a sintase do fator lacrimogêneo. Ela seria tão perfumada quanto as outras porque a alinase e a produção de tiossulfinato permaneceriam intocadas. Os transgênicos, também conhecidos como organismos geneticamente modificados, são plantas ou animais que tiveram a sua composição genética alterada em laboratório por cientistas. Todos os organismos vivos são constituídos por conjuntos de genes e as diferentes composições destes determinam as características de cada organismo. Pela alteração destas composições, os cientistas podem mudar as características de uma planta ou de um animal.

Enquanto a engenharia genética não abraça essa causa, pode-se utilizar alguns truques para cortar cebola e não chorar. Um truque é colocar as cebolas na geladeira antes de cortá-las, já que o frio inibe a atividade da enzima LF sintase. Pode-se também cortar cebolas embaixo d'água (o que não é nada prático) para evitar que os compostos voláteis cheguem até o fluido ocular e promovam a ionização do composto em ácido sulfúrico.

Como o enxofre pertence à mesma família do oxigênio na tabela periódica, as propriedades desses elementos são muito semelhantes. O enxofre forma compostos orgânicos idênticos ao oxigênio. O prefixo “tio” indica justamente a substituição de átomos de oxigênio por átomos de enxofre em determinados composto. Entre os tiocompostos, destacam-se os tiálcoois (tióis), os tioésteres (sulfetos orgânicos) e os sulfóxidos.

Figura 5 – Pricipal composto responsável pelo mau cheiro do gambá

Alguns animais utilizam como mecanismo de defesas compostos com enxofre na sua constituição. (veja Figura 5).

A Química está em todo lugar. E, apesar de algumas pessoas pensarem que ela não serve para nada, vimos que, conhecendo os processos naturais, podemos interferir para o nosso bem-estar. Na próxima vez que deparar com uma cebola, não tenha medo. Lembre-se das nossas dicas e não chore nunca mais por causa dela.

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Referências Bibliográficas

 Imai S; Tsuge N; Tomotake M; Nagatome Y; Sawada H., Nagata T; Kumagai H. Plant biochemistry: An onion enzyme that makes the eyes water. Nature - 419:685-685 (2002).

 Nagodawithana, Tilak; Reed, Gerald. Enzimes in food processing Third edition – London, Acadamic Press Inc, 1993.

 MG Jones, J Hughes, A Tregova, J Milne, AB Tomsett,and HA Collin. (2004) Biosynthesis of the flavour precursors of onion and garlic. Journal of Experimental Botany 55 (404): 1903 - 1918

 

Para saber mais

 Gareth Griffiths, Laurence Trueman, Timothy Crowther, Brian Thomas, Brian Smith. Onions - A global benefit to health:  Phytotherapy Research Volume 16, Issue 7, 2002. Pages 603-615

 Fritsch R. and N. Friesen. 2002. Chapter 1. Evolution, Domestication, and Taxonomy. In H. D. Rabinovich and L. Currah (eds.) Allium Crop Science – Recent Advances. CABI Publishing  5-30
http://www.cabi-publishing.org/pdf/Books/0851995101/0851995101Ch1.pdf

 Edwards SJ, Musker D, Collin HA and Britton G (1994). The analysis of S-alk(en)yl-L-cysteine sulphoxides (flavour precursors) from species of Allium by high performance liquid chromatography. Phytochemical Analysis 5 4-9
http://www.liv.ac.uk/~sd21/onion/edwards1994/edwards_et_al_1994.htm

 Tear-free onion on sale
Few chefs will shed a tear at the latest breed of vegetable - an onion which does not irritate the eyes.
http://news.bbc.co.uk/1/hi/uk/3120047.stm

 Cebola promete acabar com lágrimas e mau hálito
Embrapa desenvolve variedade doce adequada para o cultivo no Nordeste
http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/view/1372

 

 

 

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Este site foi atualizado em 15/01/11